Imagine-se sem internet, televisão ou mesmo rádio. Tente pensar em como seria passar uma noite inteira sem eletricidade, agora pense na devida situação durando meses, anos, décadas. Pois bem: automaticamente nos adaptaríamos a acordar com o sol e dormirmos com o cair dele. Resumidamente voltaríamos à época de nossos avós, coisa pouca, três gerações talvez. Mas será que nos distanciamos tanto assim de nossos antepassados?
No geral a maioria de nós ainda acorda com o primeiro sol –
claro que não por livre escolha, afinal, se pudéssemos escolher, também não
sairíamos do trabalho junto ao sol que se despede no horizonte. Mas então por
que ainda fazemos como nossos bisavós? Por que seguimos a usar o melhor horário
de nosso dia para o trabalho, trancados dentro de escritórios, correndo de um
lado para o outro sem tempo de sequer olharmos pela janela?
Até o final do século 18, as cargas horárias ficavam entre
10 e 16 horas. Henry Ford foi um dos primeiros grandes empresários a avaliar e
concordar com a ideia de Robert Owen, o qual defendia uma carga horária não
superior a 8 horas por dia. Dizia este: “Oito horas de trabalho, oito horas de
lazer, oito horas de descanso”. Não à toa Henry Ford se tornou um dos mais
bem-sucedidos homens que o mundo já viu. Seu diagnóstico preciso mostrou aos
demais poderosos da época que 8 horas de um funcionário alegre rendiam muito
mais de 16 horas de um triste.
Você deve conhecer algum empresário que gere empregos, qual
é a maior reclamação dele quanto a seus funcionários? Na maioria das vezes é o
desempenho que mais aflige o contratante, isso porque felicidade e
produtividade não se disfarçam. Fala-se muito: “esse não gosta de trabalhar”,
mas gostava o escravo de ser escravo? Tudo bem, não se pune mais com
chicotadas, mas são somente as punições carnais que qualificam o escravismo?
Acredito que não. O próprio empresário sabe ao que me refiro, afinal, ele é um
escravo do governo que o explora covardemente.
Partindo do princípio das engrenagens, não fica difícil
saber sobre os problemas desse defeituoso relógio o qual chamamos sociedade.
Trabalhamos como nossos avós, porém, a sobrevivência foi transformada em
consumo exacerbado. Se antigamente mãos
calejadas traziam o pão para a mesa, hoje, nossas metas se tornaram
inalcançáveis, pois nem nós mesmos sabemos nossos reais desejos de consumo.
Países mais avançados culturalmente já notaram que a
infelicidade não gera lucros a longo prazo. Em muitos lugares da Europa e no
próprio Oriente grandes empresas abordam seus colaboradores de forma a
mantê-los felizes. Não é por acaso que o próprio Google seja uma das empresas
de maior faturamento do planeta: mais de 10% do que arrecada é destinada ao
lazer de seus funcionários, que dispõem, por exemplo, de banheiras de
hidromassagem para serem usadas a qualquer momento.
Em 2013, nosso país quebrou seus recordes de processos
trabalhistas. Nunca patrões e funcionários estiveram tão infelizes. E ao que
tudo indica, 2014 será ainda pior. A pouca confiança que existia se quebrou. As
engrenagens se soltaram, empregados odeiam seus empregadores, os empresários,
por sua vez, não suportam mais serem explorados e muitas vezes vistos como
bandidos a cada novo processo.
A forma como vivemos hoje é muito diferente daquela de dez
anos atrás: dormimos mais tarde, mudaram as prioridades, a modernidade expandiu
e confundiu ainda mais as mentes. Ainda assim, apesar desse mundo tão
diferente, quase não observamos mudanças na forma como as empresas lidam com os
trabalhadores.
A forma como passamos a interpretar o trabalho não é um dos
reflexos da sociedade atual, mas sim uma das causas por sorrirmos cada vez
menos e acordarmos cada vez menos dispostos a levantar.