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Perco-me entre textos, poesias e músicas, percebi então que a melhor forma de arquivar era dividir. Nesses anos, muito do que não se perdeu foi graças a quem acompanha meu trabalho. Assim, na imensidão virtual deixo essas pegadas, parecem dois únicos pés, mas acreditem, carrego muito de vocês aqui.

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Quem muito anda não anda só

Deito a cabeça no travesseiro, mas não durmo, não consigo. Minhas lembranças giram e se colidem. De tanto o fazerem, por vezes se encaixam: ou será que se encaixam por já nascerem peças?

A filosofia greco-romana chama isso de fatalismo, a ordem cósmica e seus acontecimentos inexoráveis. Nós geralmente chamamos de destino. E quem nunca se indagou ou foi indagado: “você acredita em destino?”. Geralmente essa pergunta surge nos primeiros encontros com uma paquera, mas diante de tantos estímulos, a profundidade desse questionar se perde. Acontece que uma certa noite você deita para dormir e simplesmente não consegue. Fica então a pensar nesta sensação de “tinha que ser”.

Era uma tarde quente de domingo, fui até um quiosque comprar uma água. Um senhor se aproximou pedindo um refrigerante, ele vestia uma camisa do Grêmio. Geralmente não faço comentários para algo tão normal, mas naquela tarde eu fiz: disse-lhe algo simples, um rápido elogio pela camisa. O fato era que aquele senhorzinho era um escritor o qual recém havia lançado um livro pelo próprio Grêmio. O resultado dessa conversa foi que a editora dele alguns meses depois viria a publicar o meu livro.

Mais recentemente meu amigo Bruno Teles me enviou uma mensagem da Rússia. Bruno joga futebol profissionalmente. Alguns anos atrás o visitei em Recife, convivemos por quase um mês. Lembro-me dele questionar sobre onde estaria quando tivesse seu primeiro filho e aposto que se eu tivesse dito que seria na Rússia, ele no mínimo acharia engraçado.

Matheus é outro grande amigo que o futebol me trouxe. Goleirão, tinha tudo para ser o titular na época em que Victor – hoje goleiro da seleção brasileira – havia sido recém-contratado pelo Grêmio. Lembro-me de um treinamento que o Matheus pegou tudo, até que em uma brincadeira pós-treino ele machucou o ombro e ficou meses sem poder jogar.

É nesse girar de peças que junto todas. Pois naquele domingo quente, naquele exato minuto em que eu decidi comprar uma água, Natal Augusto Dornelles – o escritor – também decidiu. Sabe-se lá o motivo que o fez vestir a camisa do Grêmio e sei lá eu o motivo de ter feito um comentário sobre isso. Não sei sobre motivos, mas vejo as consequências. Meu livro publicado, através do qual conheci o Bruno que certa noite me convidou para uma festa do time onde conheci o Matheus.

Este emaranhado de acontecimentos tira o sono dos que não gostam da ideia de não poderem controlar suas vidas. Eu sou um desses a pensar que o destino a gente faz, porém, quando paro para pensar na precisa matemática que me cerca, percebo não estar sozinho. Por vezes finjo trilhar meu caminho, faço de conta estar só, mas sinto que não estou.

O poeta foi questionado: “o que jamais há de se encontrar no bolso de um suicida?” – Um bilhete de loteria por correr – respondeu. Se há esperança, há vida. Basta, então, termos olhos abertos e nos atentarmos às esquinas: elas demonstram que desistir não é uma opção quando nos percebemos uma engrenagem movida por outras.

O acontecimento é, então, irrevogável? Não sei, se soubesse não precisaria escrever, passaria apenas a vida observando e rindo de tudo e todos. Mas acredito, sim, que há fatos preestabelecidos. Por quem? Por nós mesmos. Sim, alguns chamam de lei da atração, eu prefiro chamar de “a preparação encontrando oportunidade”.

Talvez o universo goste dos chatos, talvez ele até priorize a chatice na escala dos talentos. Isso explicaria por que há tanto tempo escrevo em jornais tendo por aí tantos melhores do que eu. Bah, só de comentar isso lembrei de como comecei a escrever para o SERRANOSSA, mas essa história fica para próxima.