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Perco-me entre textos, poesias e músicas, percebi então que a melhor forma de arquivar era dividir. Nesses anos, muito do que não se perdeu foi graças a quem acompanha meu trabalho. Assim, na imensidão virtual deixo essas pegadas, parecem dois únicos pés, mas acreditem, carrego muito de vocês aqui.

segunda-feira, 27 de julho de 2015

Certo ou errado?

Muitos pensadores convergiam para o equilíbrio como sendo o grande norteador da vida humana. A noção de equilíbrio passou, então, a ser precedida pelo autocontrole, um inibidor consciente para vontades teoricamente inconscientes. Tais equivalências podem ser percebidas de forma mais concreta em questões simples: como ou não como? Posso ou não dar aquela “engordadinha” básica? Porém, as grandes questões, aquelas que realmente fazem diferença, são vistas apenas pelos mais auspiciosos, os aprimorados.
Se esse primeiro parágrafo pareceu complicado, não se preocupe: era para ser mesmo. O fato é que a gangorra de viver está sempre presente – perder de um lado e ganhar de outro. Mas como determinar o ganhar e perder quando o meio soa mais saudável?
Em 2011, iniciei uma série de palestras em escolas: diversas cidades, alunos de várias idades, escolas públicas e particulares. Foi ótimo, aprendi muito. Mas, diante das palestras que ministrei neste ano, já percebo a diferença de percepção que desenvolvi nesses quatro anos, diferenças essas que remetem justamente ao fato de que ganhar é perder e perder é ganhar. Tudo é equivalente.
Vou citar um exemplo recente. Dois dias na estrada, quatro palestras, duas escolas particulares e outras duas públicas. No primeiro dia, as particulares. Chego meia hora antes, as crianças já estão prontas, padronizadas em roupas e no silêncio que a disciplina apresenta. Começo a palestra, todos atentos, os professores sentam tranquilos entre seus alunos. Percebo que eles absorvem o que digo e sinto-me dignificado. Aplausos, agradecimentos e em fila e todos voltam às suas respectivas atividades.
Chega a vez das escolas públicas. Chego uma hora antes, pois tudo que tem “pública” no nome requer mais planejamento. As crianças começam a chegar, algumas suadas, a maioria delas gritando. Brigam pelo lugar, a professora aparta e faz o sinal da cruz. As meninas sentam na frente, os bagunceiros lá atrás – e atrás deles somente os professores, prontos a chamarem a atenção com a naturalidade de quem faz isso o dia todo. Eu falo, alguns escutam, outros não estão entendendo nada, alguns tentam bagunçar: mas eu gosto de bagunça – se deixar eu faço também e que se dane a palestra. Eles aproveitam e eu também. O plano muda, mas ninguém sai entediado. Bem-vindo à escola pública.
Agora, a grande questão. O que é melhor e pior? A disciplina é ótima, eu gosto de ser escutado, sequestrar as atenções. Na escola particular é o que ocorre, o padrão vence, a didática disciplinar cumpre seu papel e não há imprevistos. Já na escola pública, aquela bagunça não me deixa extrair o meu melhor para eles, acabo pulando conteúdos e percebo que o entendimento é bem mais complicado. Porém, há um fato nítido sempre presente nesses casos: quanto mais disciplina, menos criatividade.
Doutrinamos as crianças dizendo prepará-las para a vida, mas a história mostra que essa disciplina é apenas apoiada no princípio da aristocracia, ou seja, em algum momento lá na Grécia antiga, os pensadores mais influentes concluíram que o mundo era formado por raros capacitados intelectualmente e por outra grande maioria de medíocres. As escolas, então, tinham essa definição: separar os bons dos ruins, para que os bons governassem com uma ideia mais clara de justiça a qual beneficiaria ambos.
Esse é o ambiente em que crescemos. O primeiro grande contato com o mundo é através da escola. Mas essa matemática das equivalências não pode ser ensinada: ela precisa ser percebida de uma maneira muito individual. Pois, assim como a disciplina destrói a criatividade, o não disciplinar corrompe a liberdade futura de toda uma sociedade. É um jogo difícil para o qual em dois mil anos ninguém encontrou a resposta.
Por isso sempre aconselho: não acredite cegamente no que você acredita, pois a chance de estar errado é infinitamente maior do que a de estar certo. Esse é o primeiro papel que a escola exerce em nossas vidas: influenciar para que nos enganemos não influenciáveis.